Essa publicação está na edição do(s) dia(s): 19 de Abril de 2024.

​LEI Nº 659 de 18 de abril de 2024.

LEI Nº 659 de 18 de abril de 2024.

Súmula: “Implementa no Município de Planalto da Serra – MT o procedimento de Escuta Especializada de crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de violência, conforme disposto na Lei nº 13.431, de 04 de abril de 2017, regulamentada pelo Decreto nº 9.603, de 10 de dezembro de 2018, cria o núcleo Municipal de Escuta Especializada vinculado á Divisão da Rede de Proteção e dá outras providências”.

A CÂMARA MUNICIPAL DE PLANALTO DA SERRA, estado de Mato Grosso, APROVOU e eu, PREFEITO MUNICIPAL, sanciono a seguinte Lei:

CAPÍTULO I

DAS DISPOSIÇÕES PRELIMINARES

Art. 1º Fica instituído no Município de Planalto da Serra o procedimento de Escuta Especializada de Crianças e Adolescentes vítimas ou testemunhas de violência e cria o Núcleo Municipal de Escuta Especializada vinculada à Divisão da Rede de Proteção.

Art. 2º O disposto nesta Lei está pautado na Lei nº 13.341/2017, que normatiza e organiza o sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente vitima ou testemunha de violência, cria mecanismos para prevenir e coibir a violência nos termos do artigo 227, da Constituição Federal, da Convenção sobre os Direitos da Criança e seus protocolos adicionais, da Resolução nº 20/2005, do Conselho Econômico e Social das Nações Unidas, e de outros diplomas internacionais, e estabelece medidas de assistência e proteção à criança e ao adolescente em situação de violência e pelo Decreto nº 9.603/2018, que regulamenta a Lei nº 13.341/2017.

Art. 3º A criança e o adolescente gozam dos direitos fundamentais inerentes a pessoa humana e aos direitos específicos à sua condição de vítima ou testemunha, sendo-lhes asseguradas a proteção integral e as oportunidades e facilidades para viver sem violência e preservar sua saúde física e mental e seu desenvolvimento moral, intelectual e social.

Art.4º Na aplicação e implementação desta Lei serão considerados os fins sociais a que ela se destina e, especialmente, as condições peculiares da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento, às quais o Estado, a família e a sociedade devem assegurar a fruição dos direitos fundamentais.

Art.5º Para os efeitos desta Lei considera-se criança a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescentes aquela entre doze e dezoito anos de idade, conforme prevê a Lei nº 8.069 de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente).

Parágrafo Único: Para os efeitos desta Lei, diante das características ou peculiaridades do caso como pouca idade da criança, limitações intelectuais e auditivas, língua estrangeira, entre outros que demandem uma abordagem diferenciada, a escuta especializada será realizada pelo núcleo de Escuta Especializada, podendo ser indicado pela Rede de Proteção um profissional qualificado de acordo com a situação e comunicado ao Ministério Público ou Poder Judiciário a adequação necessária a realização da escuta especializada a fim de garantir o disposto nesta lei.

Art.6º A aplicação desta Lei terá como base os direitos e garantias fundamentais da criança e do adolescente, sem prejuízo dos princípios estabelecidos nas demais normas nacionais e internacionais de proteção dos direitos da criança e do adolescente, em especial os seguintes:

I – receber prioridade absoluta a ter considerada a condição peculiar de pessoa em desenvolvimento;

II – receber tratamento digno e abrangente;

III – ter a intimidade e as condições pessoais protegidas quando vítima ou testemunha de violência;

IV – ser protegido contra qualquer tipo de discriminação, independentemente de classe, sexo, raça, etnia, renda, cultura, nível educacional, idade, religião, nacionalidade, procedência regional, regularidade migratória, deficiência ou qualquer outra condição sua, de seus pais ou de seus representantes legais.

V – receber informação adequada á sua etapa de desenvolvimento sobre direitos, inclusive sociais, serviços disponíveis, representação jurídica, medidas de proteção, reparação de danos e qualquer procedimento a que seja submetido.

VI – ser ouvido e expressar seus desejos e opiniões, assim como permanecer em silêncio;

VII – receber atendimento por profissionais qualificados, a fim de facilitar a sua participação e o resguarde contra comportamento inadequado adotado pelos demais órgãos atuantes no processo, evitando desta forma o processo de revitimização;

VIII – ser resguardado e protegido de sofrimento, com direito a apoio, planejamento de sua participação, prioridade na tramitação do processo, celeridade processual, idoneidade do atendimento e limitação das intervenções;

IX – ser ouvido em horário que lhe for mais adequado e conveniente, sempre que possível;

X – ter segurança, com avaliação contínua pelos órgãos que compõem a rede de proteção sobre possibilidades de intimidação, ameaça e outras formas de violência;

XI – ser reparado quando seus direitos foram violados;

XII – conviver em família e comunidade;

XIII – ter as informações prestadas tratadas confidencialmente, sendo vedada a utilização ou repasse a terceiro das declarações feitas pela criança e pelo adolescente vítima, salvo para os fins de atendimento e acompanhamento pela Rede de Proteção.

Parágrafo Único: A criança e o adolescente vítima ou testemunha de violência tem direito a pleitear por meio de seus representante legal, medidas protetivas contra o autor da violência.

CAPÍTULO II

DA ESCUTA ESPECIALIZADA

Art.7º Entende-se por escuta especializada o procedimento de entrevista sobre a possível situação de violência contra a criança ou adolescente perante órgão da Rede de Proteção, limitando o relato estritamente ao necessário para cumprimento de suas finalidades.

Art. 8º O objetivo da escuta especializada é de assegurar o acompanhamento da vítima em suas demandas, na perspectiva de superação das consequências da violação sofrida, inclusive no âmbito familiar, voltando-se para o provimento de cuidado e atenção que a criança ou adolescente vitimizados necessitam.

Art.9º A escuta especializada será realizada quando se fizer necessária, pelo Núcleo Municipal de Escuta Especializada, em local apropriado e acolhedor, com infraestrutura e espaço físico que garantam a privacidade da criança ou adolescente vitima ou testemunha de violência, mediante encaminhamento da revelação espontânea realizada pela Rede de Proteção.

Parágrafo Único: A revelação espontânea é a revelação feita por criança ou adolescente sobre a vivência de situação de violência que envolva quaisquer formas de violências descritas nesta Lei.

Art.10º Os profissionais que atuam no Núcleo Municipal de Escuta Especializada, em especial no procedimento de escuta especializada, deverão obrigatoriamente ser servidores públicos estatutários previamente capacitados e possuírem o perfil adequado e aptidão para a função.

Parágrafo Único: Os critérios para o exercício da função serão definidos através de normativa própria do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente – CMDCA e referendados no Protocolo Teórico do Procedimento de Escuta Especializada do Município de Planalto da Serra – MT.

Art.11º Os fatos narrados durante a escuta especializada da vítima e de seus responsáveis legais poderão ser compartilhados, através de relatórios, com os demais serviços da Rede de Proteção observando-se para isso o caráter confidencial das informações, limitando-se ao estritamente necessário para os atendimentos e encaminhamentos pertinentes a cada caso.

Parágrafo Único: A escuta especializada não tem escopo de produzir prova para o processo de investigação e de responsabilização, e fica limitada estritamente ao necessário para o cumprimento de sua finalidade de proteção social e de provimento de cuidados, conforme estabelecido pelo artigo 19, § 4º, do decreto nº 9.603 de 10 de dezembro de 2018.

Art.12º A coleta de informações deve buscar o máximo de subsídios com familiares da vítima e os profissionais que tiverem contato direto com a mesma, limitando desta forma a abordagem direta da criança ou do adolescente ao estritamente necessário.

CAPÍTULO III

DAS FORMAS DE VIOLÊNCIA

Art.13º Para efeitos desta Lei são formas de violência:

I – violência física, entendida como a ação infligida à criança ou adolescente que ofenda sua integridade ou saúde corporal ou que lhe cause sofrimento físico;

II – violência psicológica:

a) Qualquer conduta de discriminação, depreciação ou desrespeito em relação à criança ou adolescente mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, agressão verbal e xingamento, ridicularização, indiferença, exploração ou intimidação sistemática (bullying) que possa comprometer seu desenvolvimento psíquico ou emocional; b) O ato de alienação parental, assim entendido como a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente, promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou por quem os tenha sob sua autoridade, guarda ou vigilância, que leve ao repudio de genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este; c) Qualquer conduta que exponha a criança ou adolescente, direta ou indiretamente, a crime violento contra membro de sua família ou de sua rede de apoio, independentemente do ambiente em que cometido, particularmente quando isto a torna testemunha.

III – violência sexual, entendida como qualquer conduta que constranja a criança ou adolescente a praticar ou presenciar conjunção carnal ou qualquer outro ato libidinoso, inclusive exposição do corpo em foto ou vídeo por meio eletrônico ou não, que compreenda:

a) Abuso sexual, entendido como toda ação que se utiliza criança ou adolescente para fins sexuais, seja conjunção carnal ou outro ato libidinoso, realizado de forma presencial ou por meio eletrônico, para estimulação sexual do agente ou terceiro; b) Exploração sexual comercial, entendida como o uso da criança ou adolescente em atividade sexual em troca de remuneração ou qualquer outra forma de compensação, de forma independente ou sob patrocínio, apoio ou incentivo de terceiro, seja de modo presencial ou por meio eletrônico; c) Tráfico de pessoas entendida como o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou acolhimento da criança ou adolescente, dentro do território nacional ou para o estrangeiro, com o fim de exploração sexual, mediante ameaça, uso da força ou outra forma de coação, rapto, fraude, engano, abuso de autoridade, aproveitamento de situação de vulnerabilidade ou entrega ou aceitação de pagamento, entre os casos previstos na legislação;

IV – violência institucional, entendida como a praticada por instituição pública ou conveniada, inclusive quando gerar revitimização.

Parágrafo Único: Qualquer conduta prevista em outras legislações que configurem ameaça ou violação contra os direitos da criança ou adolescente.

CAPÍTULO IV

DA INTEGRAÇÃO DAS POLÍTICAS DE ATENDIMENTO

Art.14º Fica criado o Núcleo Municipal de Escuta Especializada, como forma de integrar as políticas de assistência social, saúde, educação e segurança pública para o cumprimento do disposto na Lei nº 13.431 de 4 de abril de 2017, que normatiza e organiza o sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência, cria mecanismos para prevenir e coibir a violência, estabelecendo o procedimento de escuta especializada de crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de violência.

Art.15º No Município de Planalto da Serra, o procedimento de Escuta Especializada acontecerá de forma integrada entre as políticas de assistência social, saúde, educação e segurança pública, devendo cada uma delas disponibilizar profissionais, em compatibilidade com a demanda, para atuar e compor a equipe do Núcleo Municipal de Escuta Especializada, vinculado à Divisão da rede de proteção e para realizar o procedimento da escuta especializada, adotando juntamente com o Sistema de Justiça ações articuladas, coordenadas e efetivas voltadas ao acolhimento e ao atendimento integral às crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de violência.

Art.16º As ações de que trata o artigo 15º seguirão as seguintes diretrizes:

I – abrangência e integridade, devendo comportar avaliação e atenção de todas as necessidades da vítima decorrentes de ofensas sofridas;

II – capacidade interdisciplinar continuada, preferencialmente conjunta, dos profissionais;

III – estabelecimento de mecanismos de informação, referencia/contra referencia e monitoramento dos casos encaminhados ao Núcleo Municipal de Escuta Especializada;

IV – celeridade do atendimento, que deve ser realizado imediatamente ou tão logo quando possível após a revelação da violência;

V – obediência ao principio da intervenção mínima dos profissionais envolvidos.

CAPÍTULO V

DO FLUXO DE ATENDIMENTO

Art.17º Qualquer pessoa que tenha conhecimento ou presencie ação ou omissão, praticada em local público ou privado, que constitua violência contra criança ou adolescente tem o dever de comunicar os fatos aos serviços de recebimento e monitoramento de denuncias (Disque 100 ou Disque 181), ao Conselho Tutelar ou à autoridade Policial, os quais, por sua vez, cientificarão imediatamente o Ministério Público.

Art. 18º O profissional, independentemente de qual órgão fizer parte, que receber uma revelação espontânea da criança ou adolescente sobre qualquer ato de violência, deverá encaminhar o registro da revelação espontânea anexada ao instrumento de referência/ contra referencia, que constam no Protocolo Teórico do Procedimento de Escuta Especializada no Município de Planalto da Serra, ao Núcleo Municipal de Escuta Especializada, com o conhecimento de seus superiores hierárquicos, bem como notificar o setor de vigilância Epidemiológica e o Conselho Tutelar, por meio da ficha SINAN (Sistema de Informação de agravos de notificação).

§ 1º O registro da revelação espontânea deverá descrever os acontecimentos da forma mais fidedigna possível.

§ 2º O profissional que receber a revelação espontânea da criança ou adolescente sobre uma situação de violência deverá acolher a vítima, escutá-la sem interrupções, efetuando o mínimo possível de perguntas.

§ 3º O profissional que receber a revelação espontânea da criança ou adolescente, respeitando o grau de entendimento, que levará a situação de violência ao conhecimento das autoridades competentes, informando a vítima que poderá vir a ser necessária a realização do procedimento de escuta especializada.

§ 4º Após a revelação espontânea é terminantemente proibido que a criança ou adolescente seja ouvida por outros profissionais, com exceção dos profissionais responsáveis pela escuta especializada e depoimento especial, este último, realizado perante a autoridade policial ou judiciária, evitando desta forma revitimização, bem como a agregação de informações distorcidas. Considera-se ainda que a abordagem inadequada com a criança ou adolescente pode desencadear danos emocionais à vítima e prejudicar a continuidade dos procedimentos necessários.

Art. 19º Ao chegar ao conhecimento do Núcleo Municipal de Escuta Especializada o registro da revelação espontânea, e analisada a necessidade de se realizar o procedimento da escuta especializada, será a mesma agendada mediante data e horário no qual a criança ou adolescente possa comparecer para o procedimento da escuta especializada acompanhado por seu representante legal. Para tanto, a família será informada através de contato telefônico e/ou solicitação por escrito, que será entregue no endereço que consta no encaminhamento.

Art. 20º A data e o horário agendado para o procedimento de escuta especializada será comunicada imediatamente ao Conselho Tutelar via e-mail e contato telefônico para ciência e para notificação da família, de acordo com suas atribuições descritas na Lei nº 8.069/1990, garantindo desta forma que a vítima seja ouvida e consequentemente, tenha seus direitos assegurados.

Art. 21º O profissional do Núcleo Municipal de Escuta Especializada realizará a entrevista com a vítima e o responsável, fazendo os encaminhamentos necessários junto à Divisão da Rede de Proteção a fim de assegurar a proteção integral e de provimento de cuidados à criança ou adolescente de acordo com o estabelecido pelo fluxo de atendimento disposto pelo Protocolo Teórico do Procedimento de Escuta Especializada do Município de Planalto da Serra, além de encaminhar a devolutiva ao órgão que encaminhou a revelação espontânea.

CAPÍTULO VI

DAS DISPOSIÇÕES FINAIS

Art. 22º Cabe às políticas de assistência social, saúde, educação e segurança pública disponibilizar no seu quadro de recursos humanos servidores públicos estatutários, previamente capacitados e com perfil adequado e aptidão para a função para atuar no Núcleo Municipal de Escuta Especializada.

Art. 23º Compete a Rede de Proteção, Ministério Público, Poder Judiciário e Autoridade Policial a garantia do disposto nesta Lei, seguindo o fluxo de atendimento descrito no Capítulo V.

Art. 24º O Núcleo Municipal de Escuta Especializada vinculado estruturalmente à Divisão da Rede de Proteção, estará em tempo, por se tratar de uma ação intersetorial, sob responsabilidade da Secretaria Municipal de Assistência Social, Gestão e Trabalho no que diz respeito às orientações técnicas e a execução das ações a serem desenvolvidas. Cabe às políticas de Educação, saúde e segurança pública garantir subsídios complementares à política de assistência social, necessários para a efetivação das ações propostas pelo Núcleo Municipal de Escuta Especializada, em especial ao procedimento de escuta especializada.

Art. 25º O Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente – CMDCA deverá instituir um Comitê de Gestão Colegiada da Rede de Cuidado e de Proteção Social de Crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de violência composto por representantes das políticas públicas da rede de atendimento a criança e ao adolescente e do próprio CMDCA com a finalidade de articular, mobilizar, planejar, acompanhar e avaliar as ações da rede intersetorial, além de colaborar para a definição dos fluxos de atendimento e o aprimoramento da integração do referido Comitê dentre outras atribuições previstas pelo artigo 9º do Decreto 9.603/2018.

Art. 26º Compete ao Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente – CMDCA assessorado pelo Comitê de Gestão Colegiada da Rede de Cuidado e de Proteção Social de Crianças e Adolescentes Vítimas ou Testemunhas de Violência monitorar a efetivação do fluxo proposto por esta Lei, a fim de garantir que crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de violência recebam o atendimento necessário de qualidade e de forma a evitar o processo de revitimização.

Art. 27º Esta Lei entra em vigor a partir da data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.

Prefeitura Municipal de Planalto da Serra, Mato Grosso, em 18 de abril de 2024.

Natal Alves de Assis Sobrinho

Prefeito Municipal