Essa publicação está na edição do(s) dia(s): 27 de Julho de 2015.

PROCESSO ADMINISTRATIVO 05/2015

Processo n. 05/2015

Interessado: PPO PAVIMENTAAÇÃO E OBRAS LTDA.

Assunto: Impugnação ao Edital de Concorrência Pública n. 002/2015 – Condições de Participação

Trata-se de impugnação ao Edital de Concorrência Pública nº. 002/2015, interposta pela licitante PPO – PAVIMENTAÇÃO E OBRAS LTDA., em relação aos termos previsto pelo edital, no que diz respeito ao regime de contratação por empreitada por preço global, exigência de índices econômicos e financeiros em desacordo com a legislação, além de constar na peça editalicia, exigência para subcontratação em descompasso com a norma legal.

DA ESCOLHA DO REGIME DE EXECUÇÃO.

No regime de empreitada por preço global, à Administração interessa o todo, não as unidades que compõem as partes, por isso que a LLC o define como aquele regime no qual a Administração “contrata a execução da obra ou do serviço por preço certo e total” (art. 6º, VIII, a – sublinhamos).

Na empreitada por preço global, não interessa à Administração, por exemplo, ter a fundação e a estrutura de um prédio se não lhe é entregue a edificação com a rede lógica, elétrica e tudo o mais que lhe agregue a funcionalidade inicialmente vislumbrada. Não obstante o objeto seja executado conforme as medições, continua a interessar o todo, o produto final.

A diferença essencial entre os regimes de empreitada por preço unitário e por preço global, enquanto na primeira, a Administração quer justamente a contratação e prestação das unidades em partes dos serviços licitados, na empreitada por preço global, somente interessa o todo.

A definição do regime de execução relaciona-se com a estratégia de contratação prevista pela Administração, conforme já reconheceu o TCU no Acórdão nº 617/2003-Primeira Câmara:

Nas licitações e contratações diretas para a execução de obras e serviços de engenharia: efetue, preliminarmente a licitação ou a contratação direta, avaliação econômica das alternativas de forma de ajuste (execução direta ou execução indireta em regime de empreitada integral, empreitada por preço global, empreitada por preço unitário ou uma composição dos regimes de empreitada por preço global ou por preço unitário com a compra direta de materiais), justificando, desta forma, a escolha daquela que se revelar mais conveniente para o caso;

Portanto, a modalidade escolhida pela Administração se amolda às necessidades pretendidas pela Municipalidade.

DA EXIGÊNCIA DE ÍNDICES ECONÔMICOS E FINANCEIRO.

A Constituição Federal, em seu artigo 37, XXI, expressamente dispõe que o processo de licitação pública somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.

Desta forma, e como a Lei de Licitações o faz, é permitido que a Administração Pública exija a demonstração da boa condição financeira e técnica daqueles que desejam com ela contratar, sempre que isso for indispensável.

Por isso é que a Lei 8.666, de 1993 previu alguns mecanismos para Administração aferir a idoneidade dos licitantes, mas consignou que tais requisitos poderiam ser dispensados, na linha da previsão constitucional. Na verdade, tais requisitos devem ser dispensados sempre que não forem indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.

Por esse motivo, a regra geral é não se exigir dos licitantes maiores demonstrações, e isso grassa na maior parte dos processos licitatórios, como o quer a Constituição Federal.

Ocorre, entretanto, que a experiência tem demonstrado que um número considerável de contratos de prestação de serviço com disponibilização de mão de obra em regime de dedicação exclusiva tem se revelado uma fonte de grandes prejuízos para a Administração Pública e para os trabalhadores envolvidos.

Não seria necessário estender-se nesse ponto, por serem verdadeiramente notórios os problemas que a Administração vem enfrentando nesses contratos, nomeadamente o de falta de pagamento de salários dos empregados, do recolhimento dos tributos, dos benefícios e obrigações correlatas, até se chegar à extinção contratual, sem o pagamento das verbas rescisórias.

Um dos motivos que contribui para se chegar nessa situação é, justamente, a Administração selecionar essas empresas da mesma forma que o faz para os demais objetos contratuais, ou seja, exigindo poucas demonstrações de qualificação econômica e técnica.

O princípio da isonomia, por sua vez, reclama que os iguais devem ser tratados de maneira igual, e os desiguais, desigualmente. Assim, se este tipo de objeto contratual tem certo diferencial, não é adequado trata-lo como na generalidade dos casos. Isso ofende o sobredito princípio e inclusive causa prejuízo ao interesse público.

E não existe dúvida quanto à diferenciação desse tipo de objeto contratual, basta ver que os contratos com disponibilização de mão de obra tem merecido um tratamento bastante específico do Poder Público, seja nas instâncias normativas (com edição de normas específicas, como a IN 02, de 2008, do Ministério do Planejamento, ou a RESOLUÇÃO N.º 98, DE 2009, do CNJ), seja principalmente perante o Poder Judiciário (com milhares de julgados sobre o tema na Justiça do Trabalho, incluindo o Tribunal Superior do Trabalho, e mesmo o Egrégio Supremo Tribunal Federal).

Assim, a situação especial desse tipo de serviço demanda um tratamento diferenciado também nas licitações e contratos. A forma que tem sido feita a seleção – igualando-os com os demais - tem sido causa de vários problemas administrativos e sociais. Algumas vezes até mesmo o princípio da continuidade do serviço público tem sido afetado por conta das vicissitudes nessa seara contratual.

Por conta disso, nesses contratos com dedicação exclusiva de mão de obra, é recomendável que a Administração se valha de todo o instrumental previsto em lei para selecionar a proposta mais vantajosa. E tal instrumental tem um norte muito claro no sentido que a Administração procure contratar com empresas que tenham uma boa saúde financeira.

A principal forma de se aquilatar isso é através da análise dos balanços contábeis, com vistas a identificar a capacidade da empresa de arcar com o compromisso assumido de forma relativamente independente da Administração Pública. A lei tem o norte muito claro de afastar as empresas que se mostram totalmente dependentes da Administração para honrar os compromissos.

Isso pode ser notado mais claramente no art. 79, XV, que estabelece expressamente a responsabilidade de os contratados arcarem com até 90 dias de execução contratual, sem que a Administração implemente sua contrapartida no negócio. Nessa trilha, o artigo 31 prevê uma série de requisitos, tratados mais à frente, voltados à comprovação dessa capacidade financeira, ainda que se valha de termos destinados a colocar limites nessas exigências.

Ou seja, as exigências podem ser feitas, portanto, dentro de certos limites; quais sejam? Os limites do indispensável à garantia do cumprimento das obrigações.

A questão, portanto, é saber o que seria indispensável verificar nesses casos sobre a saúde financeira da empresa; o que a empresa precisa demonstrar para garantir minimamente o cumprimento das obrigações assumidas.

Pois bem, então, antes de mais nada, é preciso saber quais seriam estas obrigações, para só então divisar o que seria necessário comprovar.

Nesse sentido, a resposta é fornecida pela própria lei de licitações, e já foi citada acima: a empresa contratada por qualquer órgão da Administração Pública Brasileira tem a obrigação legal de executar o contrato por até 90 dias, independentemente de pagamento.

Isso significa, em termos bastante claros, que se deve perquirir a capacidade de a licitante honrar com este compromisso. A dimensão dele é que variará, de acordo com o contrato.

Fixado este princípio, de que a Administração pode exigir a demonstração da capacidade de honrar a execução do contrato por até 90 dias, sem recebimento de pagamento algum, resta então traduzi-lo em termos práticos.

Nesse passo, o artigo 31 da Lei de Licitações dispõe que:

Art. 31. A documentação relativa à qualificação econômico-financeira limitar-se-á a:

I - Balanço patrimonial e demonstrações contábeis do último exercício social, já exigíveis e apresentados na forma da lei, que comprovem a boa situação financeira da empresa, vedada a sua substituição por balancetes ou balanços provisórios, podendo ser atualizados por índices oficiais quando encerrado há mais de 3 (três) meses da data de apresentação da proposta;

II - Certidão negativa de falência ou concordata expedida pelo distribuidor da sede da pessoa jurídica, ou de execução patrimonial, expedida no domicílio da pessoa física;

III - garantia, nas mesmas modalidades e critérios previstos no "caput" e § 1o do art. 56 desta Lei, limitada a 1% (um por cento) do valor estimado do objeto da contratação.

Como, evidentemente, a certidão negativa de falência e a garantia de 1% não tem o condão de demonstrar a capacidade de execução do contrato, independentemente do pagamento por parte da Administração, serão o balanço patrimonial e as demonstrações contábeis do último exercício social que poderão revelar tal condição.

Assim, a análise de tal documento deve demonstrar que a empresa tem disponibilidade de caixa para honrar tais compromissos, ou no mínimo condições de alcançar essa condição em curto prazo. No caso dos serviços com mão de obra, em que a demanda por recursos é grande devido ao pagamento de salários e encargos, a questão não é a empresa deter patrimônio suficiente para fazer frente à magnitude das obrigações assumidas, mas sim a capacidade de transformar esse patrimônio em numerário. Em uma palavra: liquidez.

Por conta disso, percebe-se primeiramente que o capital social da empresa tem pouca significação nesse âmbito, pois pode estar todo imobilizado.

Num segundo momento, detecta-se que a demonstração de índices de Liquidez Geral, Liquidez Corrente e Solvência Geral iguais ou maiores que 1, adotados na generalidade dos casos, pouco valem para demonstrar se a empresa tem a capacidade de honrar os compromissos independentemente da Administração.

Uma empresa com R$1,50 no ativo circulante e R$ 1,00 no passivo circulante obterá tal índice, e não demonstra por isso condições de arcar com um dia sequer de contrato não cumprido por parte da Administração.

A forma de se aferir isso, portanto, é por meio da análise do capital circulante líquido da empresa, que é o resultado do seu ativo circulante MENOS seu passivo circulante.

A definição de ativo circulante é dada pelo artigo 179 da Lei 6.404, de 1976: as disponibilidades, os direitos realizáveis no curso do exercício social subseqüente e as aplicações de recursos em despesas do exercício seguinte. Ou seja, são os bens e direitos que podem ser convertidos em dinheiro em curto prazo, tais como: dinheiro em caixa, em banco, em aplicações financeiras, contas a receber, estoques, despesas antecipadas, mercadorias, matérias-primas ou títulos.[1]

Do mesmo modo, e em contrapartida, embora não exista uma definição legal de passivo circulante[2], no contexto da análise em comento pode ser entendido como as obrigações vencidas ou vencíveis em curto prazo, tais como o pagamento de tributos, salários, empréstimos, títulos ou fornecedores.

Assim, o capital circulante líquido revelará a capacidade de a empresa transformar seus bens ou parte deles em numerário, para pagar os salários, encargos e tributos e assim fazer frente às obrigações assumidas no contrato de prestação de serviços com disponibilização de mão de obra.

Em outras palavras, nesse tipo de serviço o capital circulante líquido da empresa deverá equivaler a três meses de execução contratual, ou, em termos mais precisos, deverá equivaler a três vezes o valor mensal do contrato. Esse é o limite imposto na Lei 8.666, de 1993.

Como esses contratos tem a vigência inicial fixada geralmente em um ano, como inclusive reconhecido na Orientação Normativa nº 38, da Advocacia-Geral da União, sendo que este período serve de base para se aferir o valor da contratação, tem-se que três meses de contrato equivalem a um quarto de sua vigência, de maneira que, nessa suposição, o CCL deve ser igual ou superior a ¼ do valor da contratação.

Esclarecido isso, convém acrescentar que mesmo na ausência da situação de crise contratual, ou seja, ainda que a Administração venha a implementar sua obrigação contratual, ainda assim se faz necessário a demonstração de boa saúde financeira da empresa nesse tipo de serviço, porque a Administração dispõe de no mínimo cinco dias úteis para pagamento da fatura, conforme art. 5º, §3º, da Lei de Licitações, mas a contratada deve pagar seus funcionários até o quinto dia útil do mês, conforme art. 459, §1º, da CLT. Assim, a contratada rotineiramente não terá disponível o numerário da Administração Pública para fazer frente ao pagamento dos salários, sendo absolutamente necessário, portanto, que tenha a capacidade de arcar com um mês de salários e benefícios, pelo menos.

No mais das vezes, entretanto, prevê-se o pagamento em trinta dias, como permite o art. 40, XIV, “a”, da Lei 8.666, de 1993, de maneira que, considerando ainda os prazos necessários à conferência da nota fiscal e documentos comprobatórios e ao processamento do pagamento, não raro vence nova obrigação trabalhista da contratada sem que esta possa dispor do numerário da Administração para fazer frente às suas despesas.

Por isso, ainda que não existente uma situação de crise contratual, a Administração se colocaria numa posição bastante insegura caso dispensasse a comprovação de que a empresa consegue executar dois meses de contrato, sem a contraprestação de sua parte. Ainda mais porque poderia exigir a comprovação relativa ao período de até 90 dias.

Assim é que, nos casos de serviço com mão de obra, e a experiência prática o demonstra, é realmente indispensável exigir da licitante a comprovação da sua capacidade de honrar com dois meses de contrato de forma independente da Administração. Considerando a vigência usual de 12 meses, tomada como base para aferir o valor da contratação, a empresa deve demonstrar que possui capital circulante líquido igual ou superior a 2/12 avos do valor da contratação, o que equivale a um sexto, ou 16,66%.

Tal conclusão já poderia ser extraída da diretriz da Lei de Licitações, mas esta também respalda expressamente a exigência ao pormenorizar a qualificação econômico-financeira, nos §§ 1º, 4º e 5º do artigo 31:

§ 1o A exigência de índices limitar-se-á à demonstração da capacidade financeira do licitante com vistas aos compromissos que terá que assumir caso lhe seja adjudicado o contrato, vedada a exigência de valores mínimos de faturamento anterior, índices de rentabilidade ou lucratividade.

§ 4o Poderá ser exigida, ainda, a relação dos compromissos assumidos pelo licitante que importem diminuição da capacidade operativa ou absorção de disponibilidade financeira, calculada esta em função do patrimônio líquido atualizado e sua capacidade de rotação.

§ 5o A comprovação de boa situação financeira da empresa será feita de forma objetiva, através do cálculo de índices contábeis previstos no edital e devidamente justificados no processo administrativo da licitação que tenha dado início ao certame licitatório, vedada a exigência de índices e valores não usualmente adotados para correta avaliação de situação financeira suficiente ao cumprimento das obrigações decorrentes da licitação.

Nota-se, portanto, que a exigência de capital circulante líquido de 16,66% do valor da contratação de serviço com disponibilização de mão de obra está diretamente ligada aos compromissos que a contratada terá que assumir e sua capacidade de rotação, e que tal averiguação não se confunde com valor mínimo de faturamento ou índices de rentabilidade ou lucratividade, circunscrevendo-se a revelar a capacidade de a contratada transformar seus bens ou parte deles em numerário, para pagar os salários, encargos e tributos, fazendo frente às obrigações assumidas, pelo prazo de dois meses (quando a Lei o permitiria por até 90 dias).

Ademais, tal exigência traduz-se num critério objetivo, previsto no edital, ao qual se chegou utilizando-se de conceitos básicos de contabilidade, alguns deles previsto na Lei 6.404, de 1976. O fato de a Administração ter passado a o adotar mais recentemente não significa que não seja usual no mercado, sobretudo no ramo bancário, securitário e societário, em que a análise da situação financeira e patrimonial da empresa é corriqueira e fundamental para subsidiar as decisões, além de mais rigorosa do que a praticada pela Administração.

Por fim, é essencial apontar que a exigência de comprovação de determinado capital circulante líquido não se confunde com demonstração de patrimônio líquido, e dela independe. Este último é o interesse residual nos ativos da entidade depois de deduzidos todos os seus passivos, conforme item 4.4, “c”, do Pronunciamento Conceitual Básico (R1), do Comitê de Pronunciamentos Contábeis. Ou seja, o patrimônio líquido representa, genericamente falando, a diferença entre o ativo e o passivo da empresa, mas não revela sua liquidez. A independência e eventual cumulatividade das demonstrações pode ser inferida da leitura atenta dos §§ 2º e 3º do mesmo artigo 31:

§ 2o A Administração, nas compras para entrega futura e na execução de obras e serviços, poderá estabelecer, no instrumento convocatório da licitação, a exigência de capital mínimo ou de patrimônio líquido mínimo, ou ainda as garantias previstas no § 1o do art. 56 desta Lei, como dado objetivo de comprovação da qualificação econômico-financeira dos licitantes e para efeito de garantia ao adimplemento do contrato a ser ulteriormente celebrado.

§ 3o O capital mínimo ou o valor do patrimônio líquido a que se refere o parágrafo anterior não poderá exceder a 10% (dez por cento) do valor estimado da contratação, devendo a comprovação ser feita relativamente à data da apresentação da proposta, na forma da lei, admitida a atualização para esta data através de índices oficiais.

Veja-se que se o patrimônio líquido for considerado o único dado objetivo de comprovação da qualificação econômico-financeira, os demais dispositivos (§§1º e 5º, transcritos mais atrás) perderiam sua razão de ser.

Com efeito, não faria sentido disciplinar exaustivamente a exigência de índices, estabelecendo que estes: (i) devem limitar-se à demonstração da capacidade financeira da licitante, em vista dos compromissos assumidos; (ii) não representem valores mínimos de faturamento anterior, índices de rentabilidade ou lucratividade; (iii) sejam objetivos, (iv); previstos no edital; (v), justificados no processo, e; (vi) usuais... para então indicar o patrimônio líquido como único dado objetivo.

Por conta disso, quando a Lei de Licitações sugere que a Administração poderá estabelecer a exigência de patrimônio líquido mínimo como dado objetivo de comprovação da qualificação econômico-financeira dos licitantes, está simplesmente deixando claro que isso poderá ser exigido. Não que é isso que poderá ser exigido, ou isso poderá ser exigido, pois nesta interpretação os demais dispositivos se tornariam letra morta.

Desta forma, ao prever a demonstração de determinados índices contábeis, diferentes do patrimônio líquido, a Administração não está exorbitando a Lei de Licitações, com todo o respeito a quem pensa de forma contrária. Ela está se valendo do instrumental que a lei confere para procurar garantir boas contratações, seguindo o norte legislativo voltado a trazer consequências benfazejas ao interesse público como um todo.

Está claro que a Administração pode exigir índices contábeis, e dentre eles o capital circulante líquido, e que não está restrita a verificar o patrimônio líquido. Pode, inclusive, exigir ambas as comprovações, de forma cumulativa, como expressamente prevê o §4º acima transcrito. Além disso, o §2º, que sugere a exigência de patrimônio líquido, não o menciona como o dado objetivo de comprovação da qualificação econômico-financeira dos licitantes, mas sim como dado objetivo. Ou seja, é apenas mais um dado a ser colhido, dentre os índices contábeis previstos nos parágrafos anteriormente citados (1º, 2º e 5º).

Assim, a supressão do edital da exigência de comprovação de patrimônio líquido, quando também se previr a comprovação de outro índice contábil, pode se dar por desnecessidade ou por cautela, para se evitar discussões desgastantes e prejudiciais à conclusão do processo, mas não por questão de legalidade, tendo em vista o respaldo normativo em relação a ambas as exigências, que, aliás, não se confundem.

E a importância de se exigir também a comprovação de certo percentual de patrimônio líquido é inegável, tanto é que foi expressamente destacado como sugestão legal, na medida em que corrige certa distorção observada nesse mercado, em que empresas de menor porte assumem repentinamente um contrato que não terão condições de cumprir. Assim, para esses contratos com fornecimento de mão de obra, as contratações “grandes” só devem ser realizadas com empresas de grande porte – é isso o que a Lei e a Constituição preconizam –, as médias, por empresas de médio e grande porte, e as pequenas, por empresas de pequeno à grande porte.

Isso permite uma regulação natural do mercado e um crescimento sustentável das empresas bem administradas, pois evita que empresas pequenas assumam contratos que não terão a capacidade de gerir e muito menos a de executar, caso a Administração falhe com o seu compromisso de pagamento. Desta forma, uma eventual crise contratual, causada pela Administração, não se espalhará imediatamente para todos os envolvidos – trabalhadores, servidores e público usuário – com grave comprometimento do serviço.

E por outro lado, as empresas menores, que forem vencendo licitações pequenas, irão crescer de forma paulatina, aumentando sua capacidade operacional e seu patrimônio de forma saudável e proporcional, passando então a ter condições de disputarem licitações maiores, e assim sucessivamente, até terem se tornado empresas de grande porte, numa seleção natural de mercado.

Paralelamente a isso, a Administração Pública terá garantido de forma mais eficiente o desempenho de suas funções e eventuais crises contratuais não terão se espalhado tão facilmente, aumentando as chances de serem debeladas, minorando suas consequências.

E essa relação entre o porte da empresa e o da licitação pode ser melhor capturada em função do patrimônio líquido, tendo em vista que o capital circulante líquido revela uma situação mais flutuante, podendo ser “desfigurado” por empréstimos de médio e longo prazo, por exemplo, que indicariam uma boa situação financeira da empresa em dado momento, mas não sua dimensão em termos aproximados. Já o patrimônio líquido assegura a existência de capital próprio na empresa, daí a importância deste indicador.

Assim, constata-se a possibilidade e a necessidade de se exigir a comprovação de percentual de capital circulante líquido e de patrimônio líquido.

Resta apenas um dado para realmente se certificar da capacidade da licitante de cumprir sua obrigação. Trata-se da demonstração de que os compromissos já assumidos não comprometem a capacidade financeira comprovada pela empresa através dos índices demandados (LG, SG e LC; CCL; e patrimônio líquido).

Nesse sentido, colaciona-se o seguinte trecho do Relatório do Grupo de Estudos formado por sugestão do Presidente do TCU, com a participação de servidores do TCU, MPOG, AGU, Ministério da Previdência Social, Ministério da Fazenda, Tribunal de Contas do Estado de São Paulo e Ministério Público Federal, com o objetivo de formular propostas de melhorias na contratação, gestão e término (rescisão ou fim de vigência) dos contratos de terceirização na administração pública federal:

96. Além da avaliação da capacidade econômico-financeira da licitante por meio do patrimônio líquido e do capital circulante líquido, há que se verificar ainda se a mesma tem patrimônio suficiente para suportar compromissos já assumidos com outros contratos sem comprometer a nova contratação. Essa condição pode ser aferida por meio da avaliação da relação de compromissos assumidos, contendo os valores mensais e anuais (contratos em vigor celebrados com a administração pública em geral e iniciativa privada) que importem na diminuição da capacidade operativa ou na absorção de disponibilidade financeira em face dos pagamentos regulares e/ou mensais a serem efetuados.

97. Considerando que a relação será apresentada pela contratada, é importante que a administração assegure-se que as informações prestadas estejam corretas. Desse modo, também deverá ser exigido o demonstrativo de resultado do exercício – DRE (receita e despesa) pela licitante vencedora.

98. Como, em tese, grande parte das receitas das empresas de terceirização é proveniente de contratos, é possível inferir a veracidade das informações apresentadas na relação de compromisso quando comparada com a receita bruta discriminada na DRE. Assim, a contratada deverá apresentar as devidas justificativas quando houver diferença maior que 10% entre a receita bruta discriminada na DRE e o total dos compromissos assumidos.

99. Por fim, comprovada a correlação entre o valor total dos contratos elencados na relação de compromissos e o montante da receita bruta discriminada na DRE, o valor do patrimônio líquido da contratada não poderá ser inferior a 1/12 do valor total constante da relação de compromissos.

Compreendida a razão e necessidade de se verificar os compromissos já assumidos pela empresa, sem o que as demais verificações podem se tornar inócuas, resta acrescentar que o percentual de 1/12 avos do patrimônio líquido está diretamente ligado à hipótese de o inadimplemento contratual ser da contratada, desta feita. Nessa hipótese (vivenciada, por exemplo, em situações pré-falimentares, de encerramento abrupto das atividades, de alteração de sede sem indicação do novo endereço, e outros casos de descumprimento total do contrato), o patrimônio líquido deve ser suficiente para cobrir um mês do valor de todos os contratos celebrados pela empresa, pois do contrário a garantia de cumprimento da obrigação perante a Administração contratante se esvairia, eis que, nessas situações, os credores concorrem sobre o patrimônio da contratada, e este deve ser suficiente para tentar atender às necessidades mais prementes, como pagamentos dos salários dos empregados, por exemplo, ou para ressarcir a Administração de gastos nesse sentido, geralmente incorridos por ocasião da rescisão contratual. E a possibilidade jurídica de se exigir esse dado é expressamente prevista na Lei de Licitações, no §4º do artigo 31, já transcrito:

§ 4o Poderá ser exigida, ainda, a relação dos compromissos assumidos pelo licitante que importem diminuição da capacidade operativa ou absorção de disponibilidade financeira, calculada esta em função do patrimônio líquido atualizado e sua capacidade de rotação.

Dada a clareza do dispositivo, que expressamente autoriza estabelecer uma função entre os compromissos assumidos e o patrimônio líquido, resta apenas esclarecer que a demonstração de que este é igual ou superior a 1/12 do valor total dos contratos firmados não se confunde com a demonstração de que o patrimônio líquido é igual ou superior a 10% do valor da contratação. Uma empresa de pequeno porte, por exemplo, com pouquíssimos ou nenhum contrato assumido, conseguirá facilmente demonstrar que seu patrimônio líquido é superior a 1/12 dos compromissos, mas mesmo assim pode não representar 10% do valor da contratação.

Ou seja, um índice dimensiona o patrimônio líquido da empresa em relação ao valor da contratação, buscando certa proporção entre estes, e outro afere a capacidade de a empresa honrar seus compromissos, de uma forma geral, sem comprometer o que irá assumir com a nova contratação.

Por fim, é importante registrar que não se está aqui procurando afastar as empresas de pequeno porte das licitações em geral, mas apenas fazer a necessária correlação entre o tamanho da licitação e o porte da empresa, o que não vinha acontecendo, com grandes prejuízos à Administração e aos trabalhadores envolvidos. As pequenas empresas vão continuar competindo livremente, nas licitações adequadas ao seu porte, e conforme o seu crescimento poderão disputar certames maiores, como natural e saudavelmente deve acontecer.

Suprimir tais exigências do edital seria retornar a uma situação a todos desfavorável, inclusive às próprias empresas, permitindo-se graves distorções na licitação.

Desta forma, não procedem os argumentos arguidos pelo impugnante.

DA DECLARAÇÃO DE SUBCONTRATAÇÃO.

Analisando os argumentos da impugnante, tem-se que a parcial cessão do objeto contratado, pela vencedora da licitação, é ato jurídico previsto no art. 72, da Lei 8.666/93, não constituindo tal procedimento, por si só, desrespeito à natureza intuitu personae dos contratos.

Nesse sentido caminha a jurisprudência:

DIREITO ADMINISTRATIVO. LICITAÇÃO. SUBCONTRATAÇÃO PARCIAL DO OBJETO DO CONTRATO. POSSIBILIDADE. LEGITIMIDADE PASSIVA DA CONTRATANTE PARA RESPONDER PELA CONSTRAPRESTAÇÃO ASSUMIDA JUNTO À SUBCONTRATADA. EM REGRA, OS CONTRATOS CELEBRADOS COM A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA SÃO INTUITU PERSONAE.CONTUDO, À LUZ DO DISPOSTO NO ART. 72 DA LEI N.º 8.666/93, A SUBCONTRATAÇÃO PARCIAL DO OBJETO DA LICITAÇÃO É POSSÍVEL DESDE QUE CONSTE DO EDITAL, OU DO CONTRATO ADMINISTRATIVO, AUTORIZAÇÃO EXPRESSA NESSE SENTIDO. HAVENDO A AUTORIZAÇÃO, BEM COMO CLÁUSULAS QUE PERMITAM À EMPRESA SUBCONTRATANTE, EM RAZÃO DO CONTRATO FIRMADO COM A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, AGIR COMO SUA MANDATÁRIA NAS SUBCONTRATAÇÕES, SEJA NA FORMA SOLIDÁRIA OU SUBSIDIÁRIA, TERÁ ESTA LEGITIMIDADE PARA FIGURAR COMO DEVEDORA DA QUANTIA PACTUADA COMO CONTRAPRESTAÇÃO PELA EXECUÇÃO DOS SERVIÇOS PRESTADOS E NÃO PAGOS. (Acórdão nº 404297 do Processo nº20060110846082apc; Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios. 1ª Turma Cível; data 27/01/2010) (grifo nosso).

ADMINISTRATIVO. LICITAÇÃO. RECURSOS DE FINANCIAMENTO. INTERMEDIAÇÃO PELO PRÓPRIO CONTRATADO. NÃO CARACTERIZAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE OFENSA AO ART. 7º, §§ 2º, I, II E 3 º, DA LEI 8.666/93. CESSÃO PARCIAL DO CONTRATO. LEGALIDADE. ART. 72, DA LEI DE LICITAÇÕES. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. LOCUPLETAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. 1– A Lei de licitações, em seu artigo 7º, §§ 2º, I, II e 3 º, veda que a própria contratada, vencedora de procedimento licitatório, seja responsabilizada pelo aporte dos recursos para realização do objeto adjudicado. Não caso concreto, tal não ocorreu, não se verificando qualquer ofensa ao dispositivo em referência. 2– A parcial cessão do objeto contratado, pela vencedora da licitação, é ato jurídico previsto no art. 72, da Lei 8.666/93, não constituindo tal procedimento, por si só, desrespeito à natureza intuitu personae dos contratos. 3 - Na espécie, embora o Município busque a anulação de contrato de cessão praticado entre a original vencedora da licitação e a empresa recorrida, bem como de todos os atos dali decorrentes, não há qualquer ofensa à legislação federal, razão suficiente para a denegação do pedido. 4– Demonstrada a efetiva realização do objeto contratado – no caso, obras de infraestrutura no Município -, não pode a Administração, ao argumento de eventual irregularidade no estabelecimento do ajuste, furtar-se, na espécie, ao adimplemento de sua obrigação pecuniária com o particular. 5 - As mesmas moralidade e legalidade que devem permear os atos públicos, inclusive as contratações, devem, também, vedar o enriquecimento ilícito e o locupletamento de qualquer das partes, aí se inserindo a própria Administração Pública. 6– Recurso especial conhecido e desprovido.

(STJ - REsp: 468189 SP 2002/0099990-4, Relator: Ministro JOSÉ DELGADO, Data de Julgamento: 18/03/2003, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 12.05.2003 p. 221). (grifo nosso).

Importante esclarecer, sob o ponto de vista jurídico, que permitida a subcontratação, a empresa vencedora do certame e contratada não se exime das responsabilidades legais e contratuais, permanecendo a única responsável, perante a Administração Pública, pelo regular cumprimento do contrato.

Assim, a contratada responde perante a contratante pela execução total do objeto contratado e não há qualquer relação entre a contratante e a subcontratada, de modo que, também, pelos atos ou omissões desta, ela é plenamente responsável. A responsabilidade da contratante é plena, legal e contratual.

Aliás, não é a toa que o Estatuto Federal Licitatório admite a subcontratação parcial do objeto licitado. Com efeito, há situações, em que não há por que impedir-se que a contratada transfira ou ceda a terceiros, a execução parcial do objeto, dada a concentração, racionalização e especialização de atividades.

FLORIANO AZEVEDO MARQUES NETO ilustra, com muita propriedade, a hipótese de a Administração contratar uma empresa, para executar uma ponte, e afiança que não se está pretendendo que ela execute, por si própria, todos os serviços que compõem tal obra, o que seria absolutamente inviável, não importando, pois, se as fundações se fizerem por subcontratada, empresa especializada, porque a contratada responderá por vícios que advierem e a relação da Administração será sempre com esta, diretamente (cf. parecer, in Boletim de Licitações e Contratos, Editora NDJ de São Paulo, número 2, de fevereiro de 1996).

De fato, não há razões objetivas, jurídicas e técnicas, que demonstre que os serviços licitados não possam ser parcialmente subcontratados, e por esta razão, é de suma importância que a Administração Pública possibilite a subcontratação parcial do objeto licitado, motivo pelo qual a manutenção da declaração de subcontratação deverá ser mantida no edital impugnado.

Ademais, exigir-se que a pretensa licitante apresente, antemão, quais serão suas parceiras na empreitada, imprime garantias de verificação prévia, pela Administração, quanto à regularidade das empresas a serem utilizadas.

Isso por que, a verificação por parte da Administração, quanto à regularidade de seus contratados, apesar de possibilitar a subcontratação, não se limita ao contratado direto e originário, mas, também, dos terceiros envolvidos na matéria. Tudo em busca da garantia do direito da ordem pública e segurança jurídica dos serviços sob a guarida da Administração.

Sendo assim, julgo improcedentes os pedidos formulados pela impugnante, mantendo inalterados os termos do Edital de Concorrência Pública nº. 002/2015.

Verifique-se que a previsão editalícia atacada não apenas origina-se de previsão normativa como tais previsões já tiveram sua legalidade reconhecida por órgão de controle externo, sendo, então, recebida e JULGADA IMPROCEDENTE a presente Impugnação ao Edital, pelos fundamentos explicitados.

É a resposta ao pedido de impugnação apresentado.

Terra nova do Norte, 23 julho de 2015.

Armando Datsch

Presidente Titular Portaria 208/2015

Juliana Pasa Woloszin

Secretaria Titular 208/2015

Patricia Daguetti

Membro Titular 208/2015

[1] http://pt.wikipedia.org/wiki/Ativo_circulante. Acesso em 20 de março de 2012.

[2] Existe a definição técnica de Passivo, dada pelo item 4.4, “b”, do Pronunciamento Conceitual Básico (R1), do Comitê de Pronunciamentos Contábeis: uma obrigação presente da entidade, derivada de eventos passados, cuja liquidação se espera que resulte na saída de recursos da entidade capazes de gerar benefícios econômicos.