Essa publicação está na edição do(s) dia(s): 23 de Março de 2015.

VETO N° 001/2015,

VETO N° 001/2015,

EM, 12 DE MARÇO DE 2015.

RAQUEL CAMPOS COELHO, Prefeita Municipal de São José do Xingu, Estado de Mato Grosso, no uso de suas atribuições que lhe são conferidas por lei, faz saber que o Poder Executivo Municipal VETOU a o projeto de lei nº 94 encaminhado pela Câmara Municipal:

Fica

VETADO

o projeto de lei nº 94 (LEI ESTOU DE OLHO) encaminhado pela Câmara Municipal".

Gabinete da Prefeita, em 12 de Março de 2015.

RAQUEL CAMPOS COELHO

PREFEITA MUNICIPAL

JUSTIFICATIVA/RAZÕES DO VETO Nº001/2015

Referência:

Veto nº 001/2015 ao Projeto de Lei nº 94 "LEI ESTOU DE OLHO", encaminhado pela Câmara Municipal de Vereadores, na data de 25/02/2015, que "DISPÕE SOBRE AUTORIZAÇÃO AO PODER EXECUTIVO MUNICIPAL PARA ADOTAR MEDIDAS NA PROTEÇÃO E GERENCIAMENTO DOS BENS PÚBLICOS E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS".

Senhores Vereadores,

Trata-se de Projeto de Lei, enviada pela Câmara Municipal de São José do Xingu à atual gestão, na data de 25/02/2015, projeto de lei este, que merece ser vetado, pelos fatos e fundamentos que passa a escandir:

Nos últimos anos, nossos Tribunais vêm decretando a inconstitucionalidade de centenas de leis, retiradas do ordenamento jurídico por vício de iniciativa, ou seja, que foram propostas por entes que não têm competência para sua elaboração.

A Carta Magna delimita o poder de iniciativa legislativa ao dispor sobre a competência para iniciativa do processo legislativo em matérias de iniciativa reservada, indicando expressamente seus titulares, de forma que, se iniciada por titular diferente do indicado pela CONSTITUIÇÃO FEDERAL/88, o ato restará inválido.

O processo legislativo se dá através de várias fases: iniciativa, discussão e votação, sanção e veto, promulgação e publicação.

Iniciativa: é o ato pelo qual se origina e inicia o processo legislativo; poder ou faculdade que se atribui a alguém ou a algum órgão, e, após a CONSTITUIÇÃO FEDERAL/88, também à população, para apresentar projetos de lei ao Poder Legislativo. No âmbito municipal, a iniciativa de projetos de leis complementares e ordinárias compete ao chefe do Poder Executivo, membros da Câmara de Vereadores, à Mesa do Legislativo, às suas Comissões e cidadãos, através da iniciativa popular, observando-se os requisitos de lei. Deve haver previsão expressa na LOM, que por sua vez, deve observar o que dispõe a Constituição Federal e a do respectivo Estado-membro. O nosso direito adota o sistema de iniciativa pluralística, tendo em vista que pode ser exercitada por diversos sujeitos. Entretanto, o rol previsto no art. 61, caput, da CONSTITUIÇÃO FEDERAL, é exaustivo, pois não comporta nenhuma exceção, devendo ser aplicado aos Estados-membros e Municípios. Assim, a propositura de qualquer projeto por pessoa que não esteja prevista no referido artigo, caracteriza o ato como inconstitucional, por vício de iniciativa.

A doutrina entende que o processo legislativo é pressuposto de validade da lei, tendo em vista a obrigatoriedade de observância ao princípio do devido processo legal. Essa afirmação pode ser extraída da própria CONSTITUIÇÃO FEDERAL, através do princípio do devido processo legal. Interpretando a CONSTITUIÇÃO FEDERAL, pode-se afirmar que se o procedimento legislativo é pressuposto indeclinável da validade da lei, ele também é um procedimento necessário e obrigatório. Os elementos do processo legislativo devem ser respeitados, inclusive no que diz respeito à complexidade do ato de formação das leis e às regras de competência reservada, sob pena de estabelecer uma antijuridicidade constitucional. Tendo em vista o princípio da supremacia da Constituição, que adota um sistema de Constituição rígida, afirma-se que não pode ser invertida a aplicação de princípios obrigatórios, como o da competência reservada, para convalidar o ato posteriormente, mesmo que por vontade do Executivo, pois as normas particulares devem ser criadas de acordo com as normas dispostas na CONSTITUIÇÃO FEDERAL, que se sobrepõe a qualquer ato legislativo contrário a ela. Aliás, a validade de qualquer ato derivado da Constituição, depende de sua concordância com esta, sendo que toda lei contrária a ela, é nula e a ninguém obriga.

Nossos Tribunais têm decidido reiteradamente, pela decretação de inconstitucionalidade de leis municipais, por vício decorrente de usurpação de iniciativa, ou seja, em casos que contém vício de origem ou de iniciativa. De forma que, a Súmula 5, do STF, há muito deixou de ser aplicada pela jurisprudência. Em decorrência disso, em 1974, o STF se manifestou no sentido de que “A sanção não supre defeito de iniciativa". O STF não abordou as questões doutrinárias discutidas, mas buscou solucionar a questão por outros caminhos, argumentando sobre a diferença constitucional entre o sistema da época e o adotado pelo CF/67 e suas alterações. Nesse sentido, os fundamentos utilizados pelo Rel. Min. Oswaldo Trigueiro, na Repr. 890-GB, RTJ 69/627, onde argumentou-se: Note-se a diferença entre o sistema anterior e o atual. Naquele, a Constituição apenas outorgava competência exclusiva ao chefe do Poder Executivo para a iniciativa de certas leis, e, se o Poder Legislativo interferisse nesse âmbito de atuação do Poder Executivo, entendia-se que este - que era o destinatário da norma - poderia abrir mão de sua prerrogativa, com sua concordância a posteriori. No sistema atual, o destinatário da proibição é o próprio Poder Legislativo, e a vedação da admissibilidade de emenda) o que implica que a emenda não pode ser sequer recebida para a discussão) se exaure no âmbito desse Poder Legislativo, sem possibilidade de convalidação do ato pelo Poder Executivo, já que a proibição àquele não é prerrogativa deste, embora a favoreça. No mesmo sentido: Repr. nº 1.051-1/GO, rel. Min. Moreira Alves, DJU, 15.5.81, p. 4.428. 24 Tem-se ainda, que o fato do Direito anterior não ter vedado ao poder de emendas para o Legislativo e na CF/67, alterada pela Emenda Constitucional de 1/1969, haver disposição expressa vedando a apresentação de emendas não se sobrepõe ao postulado da supremacia da Constituição e à obediência às regras do processo legislativo a serem seguidas na elaboração das leis. Nossos Tribunais mantiveram esse entendimento por um bom tempo, porém, atualmente, o STF adota a posição de que é impossível a convalidação. A tendência da jurisprudência do STF vem melhorando cada vez mais, no sentido de fundamentar a impossibilidade de convalidação, devendo os entes da Federação observar as regras básicas do processo legislativo federal, em especial, aquelas que tratam da iniciativa reservada e dos limites do poder de emenda parlamentar. O augusto STF assim decidiu: "São inconstitucionais dispositivos de Cartas Estaduais, inclusive Emendas, que fixem vencimento e vantagens, concedem subvenção ou auxílio, ou, de qualquer modo, aumentem a despesa pública, por ser da competência exclusiva do Chefe do Poder Executivo a iniciativa de leis sobre a matéria". (ADin 199-0/PE, j. 22.04.98, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA, in Rep IOB Set./98, 1/12656). Por fim, o STF tem declarado inconstitucional o desrespeito às matérias reservadas à iniciativa do Poder Executivo, dada a sua implicação com o princípio fundamental da separação de Poderes (RDA, 215:270-8; 188-139; RTJ, 159:736). O eg. TJSP, da mesma forma, vem entendendo pela inconstitucionalidade de leis municipais onde projetos de lei de iniciativa de vereadores invadem matéria privativa do Executivo. Nesse sentido, o julgamento da ADI nº 14.749-0, j. 19.10.94, alegando que a norma constitucional relativa ao processo legislativo constitui norma-princípio e tem caráter de norma de observância impositiva para as três esferas governamentais, de modo que dela o Município não pode se afastar.

Nesse mesmo raciocínio, o entendimento do eg. TJMG, em casos de benefícios concedidos a servidores públicos municipais, por iniciativa do Poder Legislativo, em matéria 25 Igual teor: ADI nº 38.978-0, j. 8.10.97, JUIS – Jurisprudência Informatizada Saraiva, 17; ADIN nº nº 15.035- 0/4; ADI nº 11.805-0; ADI nº 17.244-0/2. 25 relativa ao quadro de pessoal do Município, de competência exclusiva do Poder Executivo (criado de forma inconstitucional pelo Legislativo, por vício de origem):

TJMG: “CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO - AÇÃO DE COBRANÇA - SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL - FÉRIAS-PRÊMIO - PREVISÃO EM LEI ORGÂNICA DO MUNICÍPIO - CONCESSÃO DE BENEFÍCIO - AUMENTO DE DESPESA PARA O PODER EXECUTIVO - INICIATIVA DO PODER LEGISLATIVO - INCONSTITUCIONALIDADE - IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO - PROVIMENTO DA IRRESIGNAÇÃO - INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 61, § 1°, "A", "B" E "C" DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA E ART. 66, III, "'A", "B" E "C" DA CARTA ESTADUAL. O Poder Legislativo em observância aos princípios da independência e harmonia entre os Poderes Públicos Estatais, não pode conceder benefícios a servidores do Poder Executivo Municipal, notadamente, quando importar em aumento de despesas." (Proc. nº 1.0106.05.018124-2/001(1), ac. de 20/07/2006, Pub: 22/08/2006). No mesmo sentido: ADIn 01: “... são de iniciativa exclusiva do Executivo projetos de lei sobre matéria financeira e orçamentária e os que aumentam vencimentos ou despesas pública, como dispõe o art. 2º, § 2º, das Disposições Constitucionais Transitórias e Lei Complementar nº 3, de 28/12/72, art. 58, incisos I e III, do Estado de Minas Gerais, com sua posterior modificação." (Cf. rel. Des. RUBEM MIRANDA, in JM 110/16). Na ADin 541-3/PB, rel. Min. MARCO AURÉLIO, restou assentado que a "Constituição Federal revela como princípio básico, a ser observado nas Constituições Estaduais, isto a teor do disposto no art. 11 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que compete ao executivo a iniciativa das leis que aumentem a remuneração de cargos, funções ou empregos públicos da Administração Direta e Autárquica – inciso II do art. 61 – sendo certo, ainda, que qualquer vantagem há de estar autorizada na Lei de Diretrizes Orçamentárias, devendo, contar com a indispensável dotação – inciso I do art. 69." (DJU 14.02.92, p. 1.165, Lex STF 162:28, RTJ 140:26). Na Adin 175-2/PR, o rel. Min. OCTÁVIO GALLOTI declarou inconstitucionais dispositivos da Constituição do Estado do Paraná que consagravam direitos dos servidores públicos, v.g. licença especial, qüinqüênios e direito a creches para filhos de até seis anos de idade, "por tratarem de matéria sujeira à iniciativa privativa do chefe do Poder 26 Executivo (art. 61, § 1º, "c" e "d", da Carta Federal)." (DJU 08.10.93, p. 21.011, Lex STF 181:5, RTJ 150:3).

Assim, nossos Tribunais tem se manifestado de forma inequívoca, sobre a inconstitucionalidade de projeto de lei que trata de matéria de competência exclusiva do Poder Executivo, criado por iniciativa do Poder Legislativo, por vício de iniciativa (ou vício de origem), isto é, decorrente de usurpação de iniciativa.

Ex positis, entendemos que o projeto de lei em epígrafe, versa sobre matéria de competência exclusiva do Poder Executivo, especialmente porque acarreta aumento de despesa pública, sendo imperioso vetar o presente Projeto de Lei Municipal nº 94 ("LEI ESTOU DE OLHO").

São nossas justificativas/razões do presente veto.

São José do Xingu – MT, 12 de Março de 2015.

RAQUEL CAMPOS COELHO

PREFEITA MUNICIPAL